Amy-a ou deixe-a

No, no, no. Não precisavam o olhar arriscado com preto e o cabelo casa de marimbondo. Amy Winehouse chamava a atenção do mundo pelo talento, pela potência vocal. A história de sua vida, como esperado, virou documentário lançado recentemente.

Me entristece saber que o fim trágico era aguardado até pela mãe, como revelou um tabloide inglês, à época de sua morte, em 2011. Era elementar, meu caro leitor, que sua carreira terminasse dessa maneira.

Então, é assim? Simples assim?

A morte de miss Winehouse era esperada? Esse desfecho trágico deveria não só ter nos entristecido, mas nos incomodado. A naturalidade com que se falou de sua “morte anunciada” foi desconfortante. A idade não me permite mais olhar ingenuamente para o show bizz.

No, no, no. A falta de intimidade com números pode, no máximo, me fazer levantar as sobrancelhas diante da soma espetacular de dinheiro que envolve artistas e gravadoras. Mas não consigo deixar de me indignar com o comportamento que nós, sociedade civilizada, temos diante de nossos ídolos.

Winehouse definhava a olhos vistos. E o que fazíamos? Consumíamos seu comportamento alterado junto com sua música de qualidade. Seu talento emocionou milhares e rendeu milhões.  Hoje ela está morta. Como tratamos quem nos emociona? Com doses de “Coitada, tão talentosa!”, ou “Doidona” ou uma overdose de frases feitas contra comportamentos fora do padrão?

Há os curiosos, mas estes não se interessavam em saber o que se passava no coração da cantora. Não, no de Amy e de outros ídolos como Janis Joplin, Jimi Hendrix, Kurt Cobain, todos mortos aos 27! Somente o distanciamento típico do consumismo insano, que faz com que tratemos tudo e todos como produtos, pode nos levar a banalizar a morte. Ficava mal, toda vez que ouvia um “Já era esperado” dito com conformidade.

A branquela com voz de negra seria apenas um produto bom, com prazo de validade curto. Tenho receio de parecer piegas, mas meu temor maior é o de perceber que engendramos uma sociedade dissipadora da vida humana como um produto qualquer. E que estejamos embrutecendo de maneira acelerada.

Certamente, muitos dos que a vaiaram por não conseguir se manter em um palco não ficaram surpresos com sua morte. Vale dizer: quando compraram ingressos sabiam tratar-se de pessoa doente. Ou seja: ela podia morrer a qualquer momento, mas abandonar um show, não, jamais! Talvez porque eles não teriam mais a oportunidade de gritar: I love you, Amy!

Agora que sua vida virou um documentário, poderíamos assisti-lo com outro olhar e nos perguntar: Quem está anestesiado? Quem precisa de reabilitação? Quem perdeu o juízo nessa triste história? Somente a cantora? No, no, no.

 Para diminuir um pouco a saudade, clique, abaixo, e ouça Rehab.

 

(Inverno, 2011; atualizado na Primavera,2015)

Foto: Google Imagens

Martha Gonzalez escreve às quintas-feiras

martha@clubedecronicas.com.br

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