Em memória ao nosso querido amigo e revisor, João Zuccaratto

Homenagem em forma de textos escritos por suas três afilhadas do Clube de Crônicas:

 

Querido João,

Hoje, quarta-feira, 23/9, publicaria neste espaço minha crônica “Arroz de festa”. Brincava com o preço do produto e o significado da expressão. Como é comum nos meus textos usava o humor.

No meio da manhã uma mensagem de zap chegou com a notícia de sua passagem. O dia perdeu a graça. Eu perdi o chão.

Como você nos deixa assim, João? Ficamos Cristina, Edsandra e eu sem o padrinho do nosso Clube de Crônicas, sem o pai dos nossos textos. Você não foi apenas nosso revisor, foi e é nosso amigo querido. 

Lindos olhos azuis com olhar de lince detectando nossos deslizes pela língua materna, melhorando nossas crônicas, incluindo até frases inteiras como só os sábios e humildes sabem fazer. 

“Mexi, mas aceitem se quiser, vocês são as mães das crianças”, costumava dizer o responsável pelo nascimento elegante de nossas crônicas. Eu respondia: “Você sempre melhora meus textos.”

Era cuidadoso, atento aos detalhes, nada passava. Profissional exemplar se autointitulava “ranheta”. Tinha um certo prazer em implicar com o imperfeito. Na verdade, era um perfeccionista. 

Lembro-me de como não nos deixava repetir palavras e o horror pela locução “que”. Em sua homenagem, escrevi essa mensagem sem utilizá-la, João.

Vá para luz, querido amigo.  Gratidão pelo carinho, gratidão pelos ensinamentos. Você vai fazer muita, muita falta.

Martha Aurélia Gonzalez

 

Como assim?

— João sofreu um infarto…

— Está internado? Onde?

— Infarto fulminante, faleceu.

— Como assim? Há poucos dias eu o encontrei almoçando, no restaurante que frequentava. Conversamos. Ele estava com o sorriso e o bom-humor de sempre.

— Foi encontrado já sem vida, em casa.

— Como assim? Era tão cheio de vida. Gostava de conversar sobre vários assuntos. Mas literatura e turismo eram suas paixões. Sempre tinha um comentário espirituoso…

— A sobrinha dele viu meu chamado no celular do tio e fez contato comigo. Está ligando para todos que o tinham contratado para algum serviço.

— Ele não vai mais concluir esses trabalhos? Como assim? E quem vai revisar nossos textos para o Clube de Crônicas? Quem vai revisar este texto? 

— A família está organizando as pendências que ele deixou…

— Pendências, como assim? João era tão organizado e responsável… Entregava um texto revisado menos de 24 horas após receber. E entregava com “algo mais”. Não só com os acertos de vírgulas e parágrafos. Mas com um toque especial, que realmente fazia a diferença. 

— A preocupação agora é com a mãe dele, que tem mais de 80 anos.

— Ele era um filho carinhoso e preocupado com a mãe. E também preocupado com a própria saúde. Fazia caminhadas bem cedinho na praia, mesmo com a pandemia, tomando todos os cuidados. Fazia refeições veganas (não sei se comia carne…), só com produtos orgânicos.

— Podíamos fazer uma homenagem para ele, quem sabe procurar uma foto na internet.

— Como assim? Ele era tão reservado, não gostava de fotos. Preferia uma caricatura que ganhou de um amigo.

— Como assim? Homenagem sem foto? Bem, se era a vontade dele…  João merece todo nosso respeito, carinho, e admiração. Deve estar agora rodeado por anjos, rindo e se deliciando com suas histórias. 

Cristina Fagundes

 

Querido João,

Escrevo algo para expressar o turbilhão de emoções sentidas neste momento. Tenho tanto para dizer, mas agora estou aqui buscando palavras em algum lugar inundado por lágrimas insistentes em emergir lá de dentro da alma transbordando em meus olhos. Acabei de saber: você se foi. 

Partiu sem deixar nenhum recado. Resolveu ir assim, de repente. Sabe? Sei que devo aceitar a sua partida, mas o apego é teimoso e continua aqui ao meu lado. Então, para consolo, fui lá reler alguns dos seus e-mails. Guardo todos eles, sabia disso?

O “senhor” sempre foi muito eficiente e organizado, respondendo quase como um flash de luz. Você, galanteador misterioso, conhecedor de mim na minha mais profunda intimidade literária. Meu confidente, meu sábio bruxo. Com o passar desses anos, criamos laços profundamente ligados às nossas vidas refletidas em textos e e-mails. Quando estava cambaleando na existência, você me revelava um segredo, uma experiência, como exemplo de perseverança. 

A gente se conhecia antes mesmo de nos ver pessoalmente. Enquanto isso, você me escrevia:

“Minha dona Edsandra,
Você também já falou de mim para sua terapeuta?
Olha, estou ficando importante…”

Quando eu passava um tempo sumida e te enviava uma crônica, a sua carinhosa reação:

“Dona Edsandra,
Sempre é bom ter notícias tuas.
Ainda mais junto de um texto tão gostoso como este…”

Você me desejava sucesso e eu fazia votos de reconhecimentos para o seu trabalho. Você é o padrinho dos nossos textos. 

Quando acertávamos as contas, você costumava me escrever:

“Dona Edsandra,
Sua exagerada!
Mas, de todo modo, muito grato.
Segue a planilha atualizada.
João Zuccaratto”

Seu João, quem vai revisar este texto? Será que você vai ler isso de algum lugar? Estou tomando cuidado com os “quês”, contudo, confesso um atordoamento estranho com a sua partida. A Saudade está me esperando na porta, nessa noite fria de outono aqui nas montanhas piemonteses da Itália. Você queria muito conhecer esse lugar…

Acendi uma vela para iluminar a sua passagem — se é que existe alguma. Você me conhece, né?! Todavia, quero acreditar você em forma de algum tipo de energia muito boa. 

Ai, meu querido João! Tem algo em mim doendo demais, um incômodo absurdo. Não tem remédio para esse dor. Talvez, o tempo venha cuidar de mim e de todas nós, suas afilhadas do Clube de Crônicas.

Vou sempre lembrar de você compartilhando do seu carinho comigo, além do seu jeito irônico de expor os fatos:

“Dona Edsandra,
Não a conheço pessoalmente e, sua vinda ao Brasil, será oportunidade única para isso.
Estarei no nosso bonito aeroporto novo, aguardando-a.
Sou um cara lindo: alto, branco, cabelos loiros esbranquiçados pelo tempo, uso óculos — realmente, coisa maravilhosa de se ver.
Como a Cristina e a Martha já sabem, uma mistura de Brad Pitt e Leonardo di Caprio — só que bem mais velho.
Acho não ser necessário levar um papel informando sobre minha presença. (…)
(…) Esta sua mensagem, mais uma vez, me faz admirá-la.
Não é fácil abrir-se para o mundo como você faz.
Já debatemos algumas vezes, por e-mail, sobre isso.
Não desanime. e falo por experiência própria, enfrentando uma vida muito difícil desde criança. (…)”

João, queria saber mais da sua história.

Depois que nos conhecemos em 2019, em um dos momentos mais difíceis desta jornada chamada vida, como um grande padrinho e amigo, você me escreveu:

“Minha linda (que o Arjan não fique ciumento, mas trato assim minhas amigas, com as quais tenho um pouco mais de intimidade; a Martha, por exemplo), me passe a forma como posso contatá-la via WhatsApp.
Estou preocupado com essa sua solidão, nesse ônibus, indo para Marataízes, depois daquela festa no aeroporto.
Não esqueça, em momento algum, o amor e carinho das pessoas amigas que foram te receber na chegada, inclusive eu, este seu admirador de longo tempo, mesmo sem a conhecer pessoalmente.
Você pode até não acreditar, mas é um amor de pessoa.
Merece, realmente. todo o carinho que te dedicaram.
Um abraço tão gostoso quanto o que me deu ao me conhecer, mesmo descobrindo eu estar bem longe de ser uma clonagem de Brad Pitt e Leonardo DiCaprio.
João Zuccaratto.”

João, o seu vinho está aqui e o nosso jantar ficará para a eternidade. 

Meu lindo, o mundo inteiro ainda vai ler sobre você. 

“Ciao!”

Com amor e carinho,

Edsandra Carneiro