Nana, neném

Posso ferir o sentimento de muitas mamães. Assim, antecipadamente, peço desculpas. Mas, sejamos sinceros: com exceção dos meus sobrinhos, recém-nascidos são muito feinhos.

O diminutivo é gentileza. A bem dizer, parecem uns monstrinhos. Bebês, a partir de um mês, não! São lindos, fofos, doces. Dão alegria só de olhar. Encantadores como um boneco de neve. Os espantalhos são os recém-nascidos.

Enrugados e irritadiços, estão sempre chorando ou tentando balbuciar alguma coisa na língua do “B”. Não “B” de bebês, e sim de burrinhos, mesmo! Acreditam em poder se comunicar? Quem entende aquilo?

Bem, alguns ouvidos são mais apurados. Eu mesma consegui decifrar quando um dos meus lindinhos, com pouco tempo de vida, tentou me chamar. Aliás, deve haver uma boa conjunção de fonemas no meu nome, porque o fato aconteceu com todos os “coisa-linda-da-tia”.

Na família, apenas eu tenho ouvido absolutamente bom. Ninguém entendia igual. Tenho genes fortes. Talvez isso explique o porquê de todos terem algo parecido comigo. É flagrante! Percebe-se já no berçário.

Eu me mantenho tranquila, observo imparcialmente o neném da família antes de qualquer comentário. Mas, quando Luísa nasceu, bastou ver o jeitinho dela se espreguiçar para saber que havia herdado as minhas pernas.

“Vai gostar de caminhar como a tia” — adivinhei. E Daniel? Mexia os bracinhos sem parar, como quem busca algo para ler. De imediato, percebi ter puxado meu gosto pela leitura. E por aí vai. Que posso fazer?

São casos raros, eu sei. Recém-nascidos, em regra, têm a mesma cara. Feia. E essa história de puxou-a-quem é outra bobageada ouvida ao visitarmos esses pingos de gente no hospital.

O ser humano nem sempre se dá conta de quando está sendo ridículo. Quando me mostram aquele pequeno ET com tantas dobras quanto o cobertor que o enrola, esperando um elogio, tenho vontade de ser franca:

— Ela há de ser inteligente ou ter algum talento especial.

Naturalmente, não faço isso. Com muita boa vontade, um recém-nascido se parece, no máximo, com um joelho. Machucado.

— Tem o seu sorriso — respondo, receosa. Afinal, quem gostaria de ouvir que sorri como um desdentado babão. Mas que! Mães ficam enternecidas e invariavelmente sorriem, querendo, penso, comprovar minha observação.

Os bebês, não! Os mal-educadinhos fingem não nos escutar. Sequer agradecem o presente levado. Aliás, quando vamos visitá-los, estão mamando ou dormindo. Isso quando não resolvem detonar o número dois na nossa frente.

Os bostinhas não se dão ao trabalho de fazer uma social. Sem falar no choro intermitente. Sem dúvida, o defeito que nos faz pensar em Herodes com mais compaixão.

E aí, reparo no quarto bem mobiliado, cheio de bichinhos de pelúcias e tais, e me pergunto: a educação não vem de berço? Pois cadê?

Não me queixo com as mães sobre a indelicadeza deles. Mulheres, quando acabam de parir, estão com os hormônios à flor da pele, sem dormir direito e 24 horas do dia atendendo aos caprichos de um ser que, quando não está fazendo xixi, está golfando. Se não têm consideração com a própria mãe…

Para mim, essa história de visitar recém-nascidos, você há de concordar, só daria certo se eles, ao menos, viessem equipados com o modo avião. Assim, não sendo da família, há tempos evito visitas nos primeiros dias. Tenho pensado até em aumentar o meu prazo e deixar para conhecer a criança, quando já estiver frequentando pelo menos as aulinhas de inglês.

Martha Gonzalez escreve, quinzenalmente, aos domingos

Imagem: www.elo7.com.br

Verão (2016)

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